Recentemente, no ano de 2019, em uma pesquisa realizada pelo Observatório do Esporte de Minas Gerais, sobre o “Perfil e Atuação dos Conselheiros Municipais de Esporte de Minas Gerais”, um preocupante dado revelou que somente 26,3% dos conselheiros municipais de esportes no estado eram do gênero feminino [1].
Nos últimos tempos, vimos alguns avanços em relação à participação das mulheres no esporte no contexto brasileiro. Se durante muitos anos elas foram proibidas de participar de competições esportivas, em 2016, nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, elas representaram 44,9% da delegação brasileira [2]. Em contrapartida, o cenário não é tão positivo quando o assunto é a participação das mulheres nos cargos de poder e de gestão no âmbito esportivo.
Uma das possíveis explicações para a baixa representatividade do gênero feminino nesses espaços é o papel que foi conferido às mulheres ao longo do nosso contexto histórico, em que as atribuições dadas a esse grupo, geralmente, limitavam-se a tarefas de âmbito privado, tais como cuidar da casa e dos filhos. Nesse sentido, somente os homens deveriam ter acesso aos espaços públicos, entre eles os destinados à política [3].
Recentemente, algumas alterações nesse cenário surgiram a partir de conquistas alcançadas por meio de lutas em prol da equidade entre os gêneros. Essas lutas vêm sendo travadas por diversos movimentos sociais de mulheres organizadas que, ao reivindicar e firmar sua cidadania, tem conseguido se inserir nos diversos espaços sociais.
Estudos apontam que os cargos executivos são cada vez mais disputados por mulheres na sociedade, algo ainda lento e tímido dentro do cenário esportivo, em que as conquistas desses postos por mulheres ainda vêm sendo penosa.
Isso ocorre, principalmente, pela forma como as relações de gênero foram estabelecidas no mundo do esporte. No caso específico brasileiro, tem-se ainda o agravante causado por um atraso no nosso contexto histórico demarcado por preconceitos e proibições à prática de esportes pelo público feminino. Esse cenário é relativamente recente pois, ainda em 1970, o artigo 54 do Decreto-Lei nº 3.199, de 14 de abril de 1941, limitava as modalidades esportivas liberadas para as mulheres [4].
Nesse sentido, assim como ainda existe a predominância masculina entre participantes das competições esportivas, nas equipes de arbitragem, entre os dirigentes, técnicos e repórteres esportivos, na gestão esportiva não é diferente. Além de ser uma questão excludente para as mulheres no setor profissional, pesquisadores da área mencionam que essa desigualdade pode, inclusive, ser um agravante para o progresso do esporte feminino de alto rendimento no país. Este já sofre com diversas desigualdades em relação a estrutura, remuneração, visibilidade, entre outros[5].
Um estudo realizado em 2006 revelou que, mesmo com a recomendação do Comitê Olímpico Internacional, indicando que a composição dos cargos diretivos dos órgãos esportivos deveria ser de pelo menos 20% de mulheres até o ano de 2005, apenas 4% dos cargos do Comitê Olímpico Brasileiro eram compostos por mulheres. As Confederações Esportivas Nacionais e o Comitê Paraolímpico Brasileiro, por sua vez, eram compostos por 1,8% e 6,5% de mulheres, respectivamente[5]. Outra pesquisa, realizada em 2013, também constatou que apenas 7% dos técnicos brasileiros eram do gênero feminino[6].
Recentemente, no ano de 2019, uma pesquisa também mostrou que, entre os 222 cargos de diretorias nas federações de futebol dos 26 estados brasileiros e Distrito Federal, apenas 8% eram representados por pessoas do gênero feminino. Ademais, em 62% dos estados não foi identificada a presença de nenhuma mulher[7].
Esses são alguns dos dados das diversas pesquisas que indicam a predominância masculina nesses ambientes. Os estudos também relatam a necessidade de reflexão sobre quais os obstáculos enfrentados para a inserção desse público nesses setores e da importância da criação de políticas estratégicas que auxiliem nesse processo[8].
Essa reflexão deve passar pelo processo de reconhecimento dessas desigualdades até chegar à consolidação e execução de ações que oportunizem a entrada desse público nesses espaços.
O meio esportivo precisa, com urgência, rever suas estruturas machistas, que o tornam um campo atrasado em relação a outras áreas, e podem acarretar, inclusive, prejuízos para o esporte brasileiro como um todo. Em outros países, que adotaram políticas afirmativas para esse fim, já é possível perceber a maior participação feminina no esporte.
Dessa maneira, nesse Dia Internacional da Luta das Mulheres, é importante destacar que as diversas vitórias conquistadas em relação à equidade de gênero no esporte foram fundamentais. Entretanto, não se pode perder de vista que ainda há muito o que mudar.
[1] MINAS GERAIS. Observatório do Esporte de Minas Gerais. Perfil e Atuação dos Conselheiros Municipais de Esporte de Minas Gerais. Relatório de Pesquisa. Belo Horizonte, dezembro de 2019. Disponível em: < https://observatoriodoesporte.mg.gov.br/wp-content/uploads/2020/01/RELAT%C3%93RIO-PESQUISA_VERSAO-FINAL-2019.pdf> Acesso em: 08 de março de 2021.
[2] SOARES, Thais. Mulheres nas Olimpíadas: Uma Longa Trajetória. Nó de Oito, 2016. Disponível em: <http://nodeoito.com/mulheres-nas-olimpiadas/#:~:text=Nesse%20ano,%20na%20Rio%202016,hist%C3%B3ria%20nem%20sempre%20foi%20 >. Acesso em: 08 de março de 2021.
[3] COELHO, Leila Machado; BAPTISTA, Marisa. A história da inserção política da mulher no Brasil: uma trajetória do espaço privado ao público. Revista Psicologia Política. São Paulo, v. 9, n. 17, junho de 2009. p. 85-99.
[4] TORGA, Monique; SANTOS, Francielle Pereira; MOURÃO, Ludmila Nunes. (2018). Gênero e Futebol: as mulheres na gestão do futebol brasileiro. VII Seminário Corpo, Gênero e Sexualidade. Rio Grande, 2018. p. 1-18.
[5] DERÓS, Carolina de Campos; GOELLNER, Silvana Vilodre. As mulheres na Gestão do Esporte Brasileiro: um estudo pioneiro. Movimento. Porto Alegre, v. 15, n. 2, p. 235-242, abril/junho de 2009.
[6] FERREIRA, Heidi Jancer; SALLES, José Geraldo Carmo; MOURÃO, Ludmila; MORENO, Andrea. A baixa representatividade de mulheres como técnicas esportivas no Brasil. Movimento. Porto Alegre, v. 19, n. 3, p. 103-124, jul/set de 2013.
[7] PASSERO, Julia; XAVIER, Luísa. A Mulher Nos Cargos De Gestão Nas Federações Do Futebol Brasileiro Em 2019. IV Seminário Internacional de Gestão e Políticas para o Esporte. Curitiba, 2019. p. 54-56.
[8] ZANATTA, Thaís Camargo; FREITAS, Daiane Miranda de; CARELLI, Filipe Gomide; COSTA, Israel Teoldo da. O Perfil Do Gestor Esportivo Brasileiro: Revisão Sistemática da Literatura. Movimento. Porto Alegre, v. 24, n. 1., p. 291-304, jan./mar. de 2018.
Fontes: