A belo-horizontina Clarisse Sampaio é treinadora do Minas Tênis Clube há 23 anos. Formada em Educação Física, pós graduada em Ciência da Natação e Treinamento Esportivo, atualmente, cursando MBA em gestão de pessoas, a profissional segue a risca os ensinamentos de um outro educador. Paulo Freire afirmava que quando se une a prática com a teoria, o resultado é uma ação criadora e modificadora da realidade.
“Nunca me permiti parar, sempre busco uma melhor qualificação”, afirmou a treinadora, que foi campeã mais de dez vezes tanto na categoria mirim quanto na categoria Petiz nas categorias Mirim e Petiz no Festival da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA). Contemplada com o Prêmio do Esporte Mineiro na Categoria Bolsa Técnico do Ano – Feminino, Clarisse contou, em entrevista ao Observatório do Esporte, sua trajetória profissional, pessoal e a paixão pelo esporte.
Antes de se tornar treinadora, qual foi seu primeiro contato com o esporte?
Eu tive uma vivência grande no esporte a minha vida inteira, com o privilégio de nascer sócia do Minas. Pelo fato do meu pai ser sócio, sempre frequentei o clube. Com 13 anos de idade comecei a fazer dança e fiquei por oito anos como dançarina, mas sempre que possível nadava e praticava outros esportes. Na Faculdade tive fiz estágio na ginástica artística e também dei aulas de natação, ensinando a nadar. Eu me formei em Viçosa e por lá também pratiquei nado sincronizado. Então, o contato com o esporte e o amor sempre estiveram presentes na minha vida, eu amo o que faço.
Quando e como decidiu se tornar técnica?
Precisei fazer um estágio supervisionado para me formar, cuja atividade realizei no Minas. Não havia estágio remunerado, ajuda de custo, nem nada. Eu chegava no Minas às 6 da manhã e saía na última aula do dia, por volta das nove horas da noite. Dessa forma, fiquei amiga de algumas pessoas. Sempre fui muito atenta, com um caderninho de anotações pegava alguns alongamentos e atividades. Com essa experiência me apaixonei ainda mais pelo esporte e tive a certeza de que queria trabalhar ali. Quando acabou o meu estágio agradeci a todos e voltei para minha festa de formatura. Na festa, o chefe da natação me ligou e fez o convite para que eu fosse trabalhar no Minas. Respondi na hora que queria, foi uma alegria muito grande, e estou no Minas até hoje.
A formação acadêmica contribui de que forma para o trabalho que você realiza hoje?
Eu acredito que a formação acadêmica é bem voltada para o que eu faço. É uma especificidade muito grande. A primeira pós-graduação que busquei foi em natação, a segunda em treinamento esportivo, e eu sou treinadora de natação. Por meio desses cursos consegui desenvolver um alongamento específico para crianças que chegam aqui sem essa característica pela forma que elas crescem hoje, sem realizar tantas atividades, diferente da nossa infância, quando a gente fazia um pouco de tudo. Atualmente vemos que as crianças são limitadas nessa coordenação motora, por isso trabalhamos esses movimentos por trinta minutos, com bola e movimentos no corpo. A formação é completamente voltada para esse ponto e agora estou fazendo um MBA em gestão de pessoas, que é buscar atender as pessoas com excelência. O curso busca maneiras de realizar essas atividades, já que somos seres humanos e precisamos valorizar isso a todo momento. Tudo precisa ser respeitado, entendido e compreendido.
Qual é o principal desafio que enfrenta no dia-a-dia como treinadora?
O maior desafio para mim hoje é lidar com os pais, com a expectativa deles, principalmente quando é com esportes de rendimento. Há pais que criam uma expectativa um pouco exacerbada nas crianças, fora do tempo. Então, às vezes tento dar uma “freada” nisso, tento reverter esse processo de expectativa muito precoce. É uma criança que está ali, tudo que ela fizer tem que ser valorizado. Não existe lugar no pódio para todos, isso é uma verdade, existem vários fatores que resultam nessa diferença. Então aqueles com um processo de maturação mais lento, que não dominam tanto os aspectos técnicos, que têm problemas com crescimento ou algum outro aspecto biológico, os pais cobram um pouco mais e entristecem a criança e até os treinadores. A cada dia, a cada informação que a criança recebe, é uma pequena vitória. Procuro reforçar isso, essas vitórias, para balancear as expectativas criadas com as crianças .
Você foi campeã do festival da CBDA diversas vezes. Como é o processo de preparação para essa competição? A que você atribui tantas conquistas? O que lhe inspira?
Acredito muito que a base da nossa vida é o amor. Alguns atletas que já cresceram e casaram e tiveram filhos me falam que querem que os filhos nadem comigo, isso é uma constante na minha vida e me deixa muito feliz. Eu gosto de pegar na massa e fazer o bolo, eu tenho prazer em ver a melhoria. Pegar o atleta e ver a melhora diária, o desenvolvimento de técnicas e da coordenação motora e ver que ele saiu de outro jeito. Acredito no amor pelo que eu faço, o amor pelo ser humano, em qualquer fase. Já trabalhei com atletas de todas as idades e me dei muito bem. Acho que é tentar entender o ser humano, ter carinho, disciplina até mesmo na hora da advertência. Procuro conversar bastante, um pouco de igual para igual e buscar estimular a criança, encontrando-se no lugar da outra pessoa e, a partir dessa maneira de trabalhar, tenho conseguido resultados.
O que o esporte representa na sua vida?
O esporte é minha vida. Fiquei um tempo sem poder praticar por causa de um problema de saúde que, graças a Deus, não era nada sério. Então fiquei sem poder fazer ginástica por um ano e fiquei muito chateada. Agora voltei com tudo e meu astral é outro. O esporte gera esse sentimento de felicidade e prazer, trazendo alegria; convívio social, então, é tudo. Eu não consigo viver sem essa palavra esporte na minha vida.
Após esses anos de carreira, qual a sua visão sobre a natação de quando você começou, comparado ao cenário atual?
Quando eu comecei a natação havia menos cobrança de rendimento. Era mais tranquilo, o resultado não era tão cobrado. O cenário começou a mudar em relação aos patrocinadores, pois quando a marca está sendo mostrada para muitas pessoas é necessário um retorno. Então existe uma cobrança, mas pelo menos aqui no Minas, a cobrança não é exacerbada. Quando as empresas entram e expõem a marca, querem esse retorno, não querem ficar no último lugar. É um estímulo que a gente aprendeu a passar para os meninos em busca sempre do melhor resultado.
Você foi contemplada pelo Prêmio do Esporte Mineiro 2017 na categoria Bolsa Técnico do Ano. O que significou para você?
Eu fiquei muito feliz e orgulhosa de mim mesma. Acredito que várias pessoas que se esforçam gostariam de estar no meu lugar. Para mim, foi um presente, sou super agradecida e emociono-me quando falo disso. Eu vivi a natação por 23 anos intensamente e penso que nunca posso deixar a peteca cair. Agradeci muito a Deus porque Ele, melhor que ninguém, sabe o quanto eu me dedico, o quanto faço e quanto eu vivo a natação. Eu poderia ter me formado, feito uma pós-graduação e ter parado por ali. Não acho que seja o suficiente, por esse motivo quero fazer diferença naquilo que faço. É muito gostoso quando você faz tudo isso e tem esse reconhecimento. Até na hora do evento eu não acreditei tanto, foi uma alegria imensurável.
O que o Bolsa Atleta representa para você?
Uma ajuda enorme. É muito bom poder adquirir um cronômetro melhor, um material de qualidade. Além do Bolsa também sou treinadora patrocinada pelo Comitê Brasileiro de Clubes, então é uma valorização profissional muito boa. Sou muito grata a tudo isso.
Observatório do Esporte de Minas Gerais