Uberlândia recebeu as delegações do Egito, Bélgica, Sérvia e Irlanda durante os Jogos Rio 2016. Além das excelentes estruturas de treinamento oferecidas pelo município, o trabalho em equipe foi essencial para a escolha dos centro de treinamentos pelas delegações.
Representando o município, Tatiana Flores se envolveu diretamente com a recepção das delegações e descobriu que participar de projetos esportivos é a sua grande paixão. Em uma conversa com o Observatório do Esporte, ela contou como começou seu engajamento em atividades esportivas, como foi a preparação de Uberlândia para receber as Olimpíadas e qual o legado deixado na cidade pelos jogos.
1) Como coordenadora do movimento olímpico na cidade, qual foi o maior desafio em receber essas delegações?
Por ser algo inédito para nós recebermos delegações olímpicas e paralímpicas para treinamento esportivo na cidade, o maior desafio inicial foi mobilizar todos para “bem receber” esses atletas visando gerar uma imagem positiva da cidade para o mundo.
Após alguns meses e diversas reuniões, conseguimos o apoio incondicional das estruturas esportivas, dos órgãos de segurança, dos parceiros públicos e privados, dos atletas locais e também de parte da população, isso fez toda a diferença em Uberlândia. É claro que, na minha opinião, poderíamos ter engajado a população de uma forma muito mais eficiente, através de palestras nas escolas com os técnicos e atletas estrangeiros, treinamentos abertos para que todos vivenciassem as modalidades olímpicas in loco, dentre outras ações que, por questões alheias à nossa vontade, não se tornaram possíveis. De qualquer forma, acreditamos que o resultado final foi positivo.
2) Como foi para você, assistir aos Jogos Olímpicos e Paralímpicos e acompanhar os resultados das delegações, tendo em vista o seu envolvimento com a preparação dos atletas?
Foi uma experiência ÚNICA. Quando se tem a oportunidade de acompanhar de perto o dia-a-dia de um atleta de alto rendimento, observando seu treinamento, suas refeições personalizadas, a dedicação constante que o mesmo e sua equipe têm para alcançar seus objetivos, não tem como não admirá-los, respeitá-los e tornar-se uma torcedora entusiasta. Você literalmente “veste a camisa” e se sente envolvida no processo pois pôde contribuir de alguma forma para que aquele atleta estivesse ali competindo em uma das mais importantes competições da vida dele. Eu acompanhei algumas competições olímpicas pela TV e também no Rio de Janeiro como torcedora, quando tive também a oportunidade de visitar a vila olímpica como convidada do Comitê Belga. E ainda, tive o privilégio de acompanhar as competições paralímpicas também no Rio como convidada do Comitê Irlandês, participando da abertura dos jogos, de eventos oficiais de patrocinadores e assistindo às competições em uma área exclusiva para a “família” dos atletas, ou seja, eu vivi intensamente os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio 2016.
3) Além de Belo Horizonte, Uberlândia foi o único município mineiro a receber o programa COB nas Ruas e contou com a presença da ex-atleta Daiane dos Santos. Você acompanhou de alguma forma esse evento?
Eu acompanhei diretamente o COB nas RUAS, desde meu primeiro contato oficial com o COB através de ofício até a execução do evento em Uberlândia. O COB nas RUAS foi super bacana e, com certeza, merece ser replicado outras vezes. Contamos com a participação de mais de 500 crianças/adolescentes no evento que, tiveram a oportunidade de conhecer modalidades até então desconhecidas por elas, tais como: badminton, golfe e luta olímpica. Mesmo com o contratempo da chuva no dia, que nos fez mudar o local das atividades em cima da hora, o engajamento das escolas locais foi muito bom. Oportunizar às crianças conhecer modalidades olímpicas distintas das habituais praticadas nas escolas, desperta maior interesse na prática da atividade física como um todo. A presença da atleta
Daiane dos Santos foi fundamental para que pudéssemos mostrar como o Esporte pode mudar efetivamente a vida das pessoas.
4) Uberlândia tem mostrado força no esporte paralímpico nos últimos anos, tendo em vista bons resultados nos Jogos Rio 2016 e nas paralimpíadas escolares. Além disso, a cidade conta com o Centro de Referência do Paratleta, no ginásio do Sabiazinho. Para além desses destaques, o que você acha que atraiu as delegações para o município? Por que essa tradição de Uberlândia no desporto paralímpico?
Uberlândia é reconhecida por ter boas estruturas esportivas até então pouco utilizadas no nosso dia-a-dia, se pensarmos no grande potencial que possuímos. O fato de termos à disposição das delegações estrangeiras a Arena Sabiazinho, o Estádio Municipal, a estrutura do Uberlândia Esporte Clube e da Universidade Federal (Campus Educação Física), a pista de Atletismo do Sesi Gravatás e toda a estrutura física do Praia Clube com certeza fez a diferença na escolha das delegações. Porém, o principal motivo para que as delegações nos escolhessem para treinamento pré-Jogos foi o fato de estarmos TODOS trabalhando juntos e em sintonia, visando à captação de equipes olímpicas/paralímpicas a fim de contribuir para o espírito olímpico.
A tradição de Uberlândia no desporto paralímpico se deve à diversos fatores. Entretanto, na minha opinião, o que tornou a cidade referência na área é o fator humano. Contamos com excelentes profissionais locais que defendem o paradesporto há muitos anos. Profissionais esses que não medem esforços para proporcionar à seus atletas as melhores condições de treinamento possíveis na cidade. A dedicação diária e o trabalho árduo que eles realizam vem sendo coroado com a participação (tanto desses treinadores quanto dos atletas) em diversas competições internacionais representando o Brasil.
5) Os centros esportivos de Uberlândia receberam 4 delegações (Egito, Bélgica, Sérvia e Irlanda) e despertaram interesse de representantes da Província de Yamanashi, no Japão. Como você avalia a integração entre Minas Gerais e esses países?
Eu acredito que o projeto MINAS 2016 foi extremamente assertivo e eficiente. Nenhum outro estado brasileiro se uniu para buscar uma captação em conjunto como fizemos nos últimos 4 anos, e isso fez grande diferença em nossas reuniões com os Chefes de Delegação nos diversos eventos oficiais realizados no Rio de Janeiro.
Devido à inúmeras questões políticas e financeiras alheias à nossa vontade, muitas delegações estrangeiras estavam inseguras e desconfiadas em relação à credibilidade dos brasileiros. O fato de participarmos das reuniões sempre em conjunto, de termos criado um material único de captação e ainda o bom relacionamento demonstrado por nós entre a esfera Municipal e Estadual e entre as entidades público e privadas, refletiu maior confiança às delegações estrangeiras e fortaleceu Minas Gerais perante as outras estruturas que trabalhavam isoladas. O resultado disso foi um grande número de equipes estrangeiras treinando em nosso Estado durante a preparação para os jogos no Rio de Janeiro.
6) Além da grande vitrine para os centros de treinamentos de Uberlândia, qual maior legado dos Jogos você identifica para o esporte a cidade após os Jogos de 2016?
Eu considero que o maior legado para o Esporte em Uberlândia com a vinda das delegações foi o projeto de desenvolvimento do Rugby na cidade. Em 2014, recebemos a visita do técnico de rugby da Irlanda que, naquela época, acreditava na classificação de sua equipe para os Jogos Rio 2016.
A equipe irlandesa infelizmente não se classificou e não treinou na cidade, mas essa visita despertou meu interesse em conhecer mais de perto o trabalho realizado pelo time do Uberlândia Rugby e ainda estimulou meu contato com a Confederação Brasileira de Rugby – CBRu, a fim de buscar o desenvolvimento e fortalecimento da modalidade, saindo um pouco das triviais modalidades praticadas nas escolas.
Algumas reuniões e muitas conversas depois, com o apoio da CBRu, do time Uberlândia Rugby e da Universidade Federal de Uberlândia conseguimos convencer a Secretaria Municipal e a Superintendência Regional de Educação a trabalharmos um projeto-piloto nas escolas públicas da cidade. Através do Programa UDI Esportiva – Desenvolvimento do Rugby, conseguimos impactar mais de 1.000 crianças e adolescentes de 14 escolas e capacitamos 16 professores de Educação Física para ensinarem a modalidade. Tal ação abriu espaço para que o time local conseguisse se instalar em um dos campos do Parque do Sabiá (espaço público por onde passam cerca de 5.000 pessoas diariamente) o que possibilita à população acesso ao esporte. Infelizmente, o Programa UDI Esportiva e o projeto-piloto de rugby não tiveram continuidade em 2017, o que me entristeceu muito. Porém, gosto de pensar que a semente foi plantada e, nada impede que os próprios professores possam dar continuidade à prática da modalidade nas escolas durante as aulas de educação física.
7) Quando e como iniciou seu envolvimento com o esporte?
Eu sempre gostei de praticar atividade física na escola e eu tive o privilégio de estudar em um colégio que valorizava muito a Educação Física. Tive a oportunidade de aprender os fundamentos, as regras e a execução de praticamente todas as modalidades esportivas, desde a natação à ginástica rítmica, e isso fez toda a diferença na minha vida. Com o passar dos anos, passei a acompanhar mais o esporte pela TV, sempre antenada nos jogos e nas competições, mas nunca inserida ativamente no meio esportivo. Em Janeiro de 2013, surgiu a oportunidade de desenvolver um projeto voltado para o Turismo Esportivo, principalmente porque visualizei um grande potencial das estruturas físicas da cidade, pouco utilizadas. À partir dessa oportunidade, redescobri a minha verdadeira paixão. Iniciamos um projeto com foco na captação de grandes eventos esportivos para o Município (foco principal na Copa 2014 e Jogos 2016) e buscamos trabalhar um legado que não fosse meramente físico, com a construção e/ou reforma de estruturas esportivas, mas um legado comportamental, focado principalmente na inspiração e motivação das crianças, jovens e adultos de Uberlândia para a prática do Esporte.
8) O que significa o esporte para você?
O esporte está diretamente relacionado à saúde e qualidade de vida, pois melhora autoestima, aumenta o nível de concentração e capacidade mental, reduz riscos cardíacos, varia positivamente o humor combatendo a depressão, fortalece os músculos do coração evitando o envelhecimento, dentre outras coisas.
Porém, o esporte é muito mais que isso, ele é uma excelente ferramenta de INCLUSÃO SOCIAL. Segundo a ONU, mesmo tendo como princípios o desenvolvimento físico e da saúde, o Esporte serve também para a aquisição de valores necessários para a coesão social e mundial, indo muito além das disputas dentro de estádios e ginásios. A prática esportiva pode evitar que crianças e jovens em situação de carência sejam aliciados por contraventores e pode ainda contribuir para que fiquem afastados do mundo das drogas, por exemplo.
Muitos gestores públicos não enxergam o esporte com esses olhos, não conseguem vislumbrar o forte potencial que a área possui para minimizar questões de outras áreas consideradas essenciais, como a Saúde e a Educação. Fora do Brasil, o olhar para o Esporte é mais profissionalizado, mais dinâmico e é capaz de permear todas as áreas com
eficiência. Meu sonho é que o Brasil possa um dia chegar a esse patamar.
9) Qual a sensação de ter sido premiado no “Melhores do Ano 2016”?
Eu me senti extremamente lisonjeada pelo prêmio, principalmente porque minha trajetória no meio esportivo ainda é muito incipiente. Eu ainda tenho muito o que aprender e desenvolver e estou me programando para isso. Embora eu não esteja mais atuando nessa área no setor público, a paixão pelo esporte e pelas suas diversas possibilidades de atuação me fizeram continuar essa jornada no setor privado.
Nesse sentido, o reconhecimento do Estado pelo trabalho que eu realizei com toda dedicação nos últimos quatro anos foi, não apenas gratificante, mas uma enorme motivação para que eu continuasse vislumbrando novas possibilidades de trabalho.
10) O Observatório do Esporte de Minas Gerais é uma iniciativa da Secretaria de Estado de Esportes (SEESP) que nasceu em 2012 com o intuito de monitorar a realidade esportiva mineira, por meio do levantamento de dados, números, indicadores e pesquisas. De cara nova em 2017, o Observatório do Esporte assume a missão de organizar e facilitar o acesso à informações e ferramentas de variadas fontes, que incentivem o diálogo e iniciativas entre agentes dos setores público, privado e sociedade civil para o fomento do esporte e da prática de atividade física em Minas Gerais. Portanto, destina-se a conselheiros, escolas e universidades, empresas, federações, clubes, entidades sem fins lucrativos, formadores de opinião, atletas, técnicos e outros profissionais do esporte, bem como o cidadão que busca a melhoria da qualidade de vida com a atividade física.
Em sua opinião, como informações esportivas podem incentivar a articulação dos diversos segmentos locais envolvidos com o esporte?
A troca de informações e experiências é muito positiva pois possibilita a disseminação das boas práticas. E a falta de comunicação é uma das maiores dificuldades enfrentadas por diversos setores. Se o Observatório de Esporte se tornar uma ferramenta efetiva de compilação de dados esportivos de Minas Gerais, isso contribuirá e muito para o desenvolvimento do esporte no Estado. Porém, essa ação só será bem sucedida se todas as instituições se comprometerem a realmente compartilhar tudo, o que na minha opinião, é um grande desafio. De qualquer forma, é uma excelente iniciativa da SEESP e caberá às instituições abrirem a mente para unir forças em prol do fortalecimento do esporte em Minas Gerais.
Observatório do Esporte de Minas Gerais